19.8.11

O controlador do tempo

Teve tempo de comprar um relógio.
Comprou para ela, mas não de presente. Usava no pulso, checando o tempo que ela levaria para chegar.
Porque o tempo era engraçado. Parecia trapacear, se estendendo quando buscava seu fim, se encurtando quando tentava fazê-lo mais longo.
E era terrível viver assim, pois um homem deve controlar seu tempo.
Ela chegou atrasada, como sempre. Mas não fora de tempo.
O tempo, esse bandido, se multiplicou sob a sombra do conforto da presença dela. E o rapaz, de carona, se esqueceu de dar valor a todos os segundos.
Então ela foi embora às três da manhã daquele domingo.
Não sei quanto tempo depois, se casou com outra, pois o tempo tudo cura. E nunca era tarde para essas coisas.
Com o tempo, teve filhos.
O tempo os fez crescer.
Durante esse tempo, trabalhou.
Se tornou um homem de pouco tempo.
E o tempo se esticou novamente, tecendo um lar, endurecendo suas ideias e deixando seus sonhos para mais tarde.
Afinal, depois teria tempo para cuidar das coisas importantes. As urgentes são para ontem, e ele não tinha tempo.
Então, naquela terça-feira chuvosa, às quatro e vinte e cinco da tarde, saiu para comprar pães. Perdeu o tempo na hora de atravessar a rua, e o caminhoneiro, apressado, estava sem tempo para parar.
Teve tempo de pensar em toda sua vida, como dizem os filmes do tempo do bom cinema: pensou em cada ano, e em progressão, lembrou-se dos momentos. Nos momentos, o tempo se esticou pela última vez: Viu cada toque. Cada beijo. Cada não. Cada milésimo de segundo projetado na tela de suas pupilas, o instante pausado de sua respiração.
Enquanto reconheceu seu relógio esmagado sob a roda, entendeu, sem mais tempo para se arrepender:
Ele nunca teve controle, afinal, tempo não é dinheiro.

Um comentário:

  1. Meu Deus que lindo!!! Tenho medo de não enxergar mais o trinco da porta do guarda-roupas, pois lá eu coleciono os seus textos mais bonitos! E esse me fez chorar pra caramba! Own Thig... me surpreendo cada vez que venho aqui e dou de cara com sua maestria e sua pena-mestra que insiste em escrever as palavras que tocam o meu coração. Lindo!!! Beijocas da amiga que te ama.

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