28.3.11

Um conto pequeno e mesquinho

Era uma criaturazinha precoce, cheia de medos, que andava curvada sob o sol.
Chamaram-o de trevas, e se arrastava como que escondendo da luz. Não tinha amigos, e todos os outros, que eram mais altos e fortes, o pisavam para alcançar as coisas que queriam.
Ele se mantinha feliz simplesmente se mantendo longe de seus caminhos.
Mas um dia a luz refletiu em um espelho e o atingiu em seu coração negro, que brilhou de volta, e todo o mundo viu a vergonha, a humilhação, o medo e o trauma se iluminar por todo horizonte. As pessoas correram da aparente maldade daquele monstro escondido, mesmo sendo pequeno, mesmo sendo fraco.
E atingido em cheio por amor e essa revelação cósmica de que poderia ser grande, se tornou forte. Seus músculos romperam velhos tendões, e com dor sua alma se expandiu, rompendo barreiras de nervos, consciência e morais embotadas. Se retorcendo no chão, gritou de liberdade que aquela linda tortura o trazia, e escoando sua maldade num caldo oleoso, negro e sujo, tornou-se limpo. O sol queimava sua pele nua cheia de vergonha, e o tostava até formar bolhas, descamar e arder.
E o mundo o viu erguer, grande, bronzeado e belo. Ele chorava com o perdão que se dava, e mesmo humilhado, sentia-se feliz.
Porque brilhava.

21.3.11

Por definição, o perdão?

Primeiro se perdoa, ou primeiro se admite a falta? Quem não assume o erro não pode ser perdoado, ou quem é rancoroso não perdoa, mesmo que se admita as falhas? Ou melhor: O que veio primeiro, o perdão ou o arrependimento? E, sendo Deus bondoso e justo, o que é mais necessário: uma vida de constante culpa (visto que todos errarão um dia), ou um constante deleitar-se na indignidade de poder aproveitar a presença dEle, mesmo num corpo pecador?
O que é maior: O Amor ou a Justiça?
Essas perguntas definem as respostas que definem o tipo da sua fé.

18.3.11

Pequeno comentário

Triste é um homem que sabe discutir política, filosofia, religião, verdades eternas, paixões e culturas, mas nunca aprendeu a se divertir.

16.3.11

The sound of silence



De todos os valores que exercito, desde a intensidade em emoções e intenção de perfeição em atitudes que gritam quando me observo, exatamente o que eu nunca busquei é o que mais sinto falta: o mediano, o silêncio, a estática, o ócio.
E se por dizer isso eu seja interpretado como mais um malandro boa-vida, não me importo. Sei que nem só de descansos se faz um caminhar, mas um andarilho lento e paciente vai mais longe e aproveita melhor o caminho do que qualquer maratonista apressado. Essa metáfora está perfeita. Passamos correndo por tantas coisas no dia-a-dia, que não temos prazer ou surpresa ao encontra-las.
Vivemos no ciclo do muito, do doar até esvair, do compensar na vingança, do chacoalhar o Pé da Intensidade para conseguir no meio das frutas verdes alguma madura. Pois precisa ser aqui, agora, dessa forma.
Mas me digam vocês, paladinos do mérito, que sempre foram vitoriosos em batalha (mesmo quando outros a lutaram): o que um homem precisa além de uma cama para dormir, um prato para comer e uma mulher para amar?
Deus, talvez. Mas Esse habita no silêncio da alma. Barulhos continuam a distrair do que importa de verdade; pregadores e revolucionários gritando em praças públicas, músicas, sempre iguais umas às outras, o martelar de obras milenares que se estendem pela história e que nunca terminam; e o eco teimoso de vozes de filósofos e psicólogos, poetas e antropólogos, tentando descobrir como alcançar o tesouro da felicidade eterna. Estou certo que está enterrado em cada peito, no coração de quem a carrega.
Mas os barulhos, aumentando, levam homens à loucura, para mais longe da solitude e do hábito de acalmar a alma abalada diante do invisível, do imutável, do não sonoro YHWH.

13.3.11

O fim dos mundos.

Algo brotou dentro de mim. E o que cresceu foi um universo.
O que eu queria dizer é que tudo o que nasce é poeira, tudo o que morre é um mundo.
Queria falar da urgência, de que passamos muito tempo contemplando o vazio enquanto estrelas colidem, o mundo gira, crianças morrem de fome e amores morrem de solidão.
Queria falar dessa humanidade em constante incômodo, se empurrando e puxando afim de estarem certos, abraçando qualquer verdade como uma luz pessoal que ilumina seu próprio canto, e não mais que isso, num universo que chama de trevas, enquanto lá fora brilham constelações.
Tanta luz em estrelas flamejantes, cometas raiados, explosões de gases, cores e maravilhas, e somos atraídos para buracos negros de nosso impulso em consumir e destruir a nós mesmos, ao nosso mundo.
O medo da humanidade é que o mundo acabe. E em breve repararemos que é verdade, esse pode ser o fim. O fim do dia. O fim da confiança. O fim de uma amizade. O fim de quem se ama.
Falem de tsunamis, de inclinações que mudam, de explosões e de cavaleiros do apocalipse, pois já ví mais fins de mundos do que sou capaz de suportar. O brilho de uma supernova nos olhos da criança que vê o enterro do próprio pai. O gelo da estrela que morre na resposta seca entre quem já disse amar. Já ví ondas varrerem corações. A terra se rachar e engolir promessas. Já ví o alvorecer doentio de um sonho moribundo.
Então, que venham os fins de mundo!
Que o fogo purifique, que a morte consuma, que a praga, a peste, e todas as bestas de profecias façam cá sua morada. Que cada parte desse mundo morra para renascer imortal.
Pois o que ninguém descobriu é que o mundo já acabou.
Isso pode ser o fim de tudo.
E eu te espero no por do sol de uma geração agonizante. Quando tudo é marcado para o fim, nada do que se faz é pequeno. Podemos ainda ser um mundo. Com vida. Milhares de eras passadas em um segundo. Afinal, o que é o tempo no fim?
Isso pode ser o fim de tudo.
Então, porque não vamos a um lugar que só nós conhecemos?
Se tudo que morre é um mundo, só ao que é imortal chamaremos lar.

12.3.11

Não é a palavra nem a ação.


Se você me conhece, sabe como odeio a frase: "o cristianismo é um estilo de vida.".
Isso é muito pesado. Pouco exige esforço, já que, para ser cristão, só é necessário imitar um modelo: como quadros, músicas ou filmes. Só é necessário repetir padrões e conceitos em roupagens um pouco diferentes.
O cristianismo também não é uma verborragia, um discurso vazio que se espalha irritantemente de pessoas igualmente vazias. Mas é óbvio, e por ser tão declaradamente errado, não é isso que eu temo.
Eu tenho medo do nicho, e da sensação de minoria. Eu tenho medo que tal definição de fé nos leve a tomar uma identidade política, de tribo, ou de uma raça, contrariando o real conceito do Reino de Deus.
Mas o que importa? Precisamos de respostas fáceis, de curas paleativas que nos ajudem a fugir das perguntas.
Imprimimos padrões desde o primeira abordagem. Queremos o controle, e por isso comandamos: Se quer levante a mão, repita a oração, diga seu nome, venha à frente, dê o dízimo, leia a bíblia, faça nossa escola de teologia, lidere um grupo, evangelize, compre nossa linda camiseta, não questione, não critique. Seja aquele quem mandamos você ser. Tenha o estilo de vida que eu sei que Jesus tinha.
E então usamos a pulseira "O que Jesus faria?". O que Jesus faria se fosse assaltado? O que Jesus faria no trânsito de São Paulo? O que Jesus faria se fosse convidado para debater extraterrestres na TV? Eu não sei. Você sabe?
Mas algum dia um encontro escandaloso e absurdo aconteceu, e então dizemos ter sido encontrados por Deus. Apesar do nível de loucura dessa declaração, afirmamos com todas as palavras: Sabemos o nome do Salvador da humanidade. Eu o ouví, Ele disse que me ama. Ele disse que não existem mais barreiras, que fui perdoado, e que habita dentro de mim.
Não é à toa que os antigos eram jogados ao coliseu e odiados pelos romanos, politeístas, que acreditavam que cada um de seus deuses era uma representação de um atributo universal. Seria muita arrogância afirmar "Minerva habita dentro de mim", pois isso transformaria a pessoa automaticamente no guerreiro mais sábio do universo. Mas era isso que diziam aqueles cristãos subversivos, com seu Deus estranho. Eles eram odiados por serem arrogantes o suficiente para dizer que através de um sacrifício messiânico, elas agora incorporavam a essência do Criador do universo, inclusive das formas do céu e todas as suas manifestações divinas. Cada cristão dizia: em mim habita algo maior que todos os poderes de seus deuses juntos.
"Então provem isso vencendo meros leões". E pereciam.
E agora vejo jovens mal vestidos, embalando jargões, tentando criar modos seguros de se namorar e recalcando antigas formas de pensar. Vejo jovens quebrando CDs e videogames, e pergunto se o deus que habita dentro deles não é Dionisio, com sua característica loucura e paixão cega.
Me pergunto o que aconteceria se um dia descobríssemos e acreditássemos que aquEle que criou a tudo e a todos se move através de nós, com toda sua humildade, poder, perdão, justiça e bondade. O que aconteceria se parássemos de fazer o que Jesus faria e acreditássemos na mesma loucura dos antigos, perguntando para Jesus: - Ei, o que você quer que eu faça?
Ele vive.
O cristianismo não é um estilo de vida. É um relacionamento escandaloso.